Transexuais e travestis vão poder usar nome social em órgãos do MEC

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21/11/2011 – 11h11

Da Agência Brasil

Brasília – Está na edição de hoje (21) do Diário Oficial da União a Portaria Nº 1.612 que assegura aos transexuais e travestis o direito de escolher o nome pelo qual querem ser tratados em atos e procedimentos promovidos no âmbito do Ministério da Educação.

Estão incluídos na norma o crachá e o e-mail. A norma prevê 90 dias para que o nome social passe a ser usado em todas as situações previstas.

Entende-se por nome social o modo como travestis e transexuais são reconhecidos, identificados e denominados em sua comunidade e meio social. Os direitos assegurados abrangem os agentes públicos do Ministério da Educação, cabendo às autarquias vinculadas a regulamentação da matéria dentro de sua esfera de competência.

Edição: Talita Cavalcante

O STJ e o Casamento Civil Homoafetivo – Participação em um Julgamento Histórico

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O STJ e o Casamento Civil Homoafetivo

Participação em um Julgamento Histórico

Paulo Roberto Iotti Vecchiatti1

No dia 25/10/11, o Superior Tribunal de Justiça, por quatro votos a um, decidiu que duas pessoas do mesmo sexo têm o direito de se casar, a despeito da omissão da legislação vigente no Brasil acerca do tema. A decisão foi proferida no julgamento do Recurso Especial n.º 1.183.348/RS.

A decisão foi histórica. A despeito de alguns juízes e algumas juízas terem reconhecido o direito de casais homoafetivos se casarem civilmente após a também histórica decisão do Supremo Tribunal Federal do dia 05/05/2011 (ADPF n.º 132 e ADIn n.º 4277), a decisão aqui comentada é de suma relevância por ter sido proferida pelo segundo tribunal em hierarquia no Brasil, que inclusive tem a competência para uniformizar a jurisprudência dos Tribunais brasileiros em matéria de Direito das Famílias (entre outras).

Tive o privilégio de poder fazer a sustentação oral em favor do casal de gaúchas perante o Superior Tribunal de Justiça. Considerando a enorme importância de tal decisão para os direitos civis dos cidadãos homossexuais, no que tange aos casais homoafetivos, o amigo militante Eduardo Piza tomou a iniciativa de pedir ao Dr. Gustavo Bernardes, que propôs a ação em favor do casal de gaúchas, bem como interpôs o recurso de apelação e o recurso especial em favor do casal, fazer um relato do histórico do caso, relato este publicado em seu blog2, no site do GADvS – Grupo de Advogados pela Diversidade Sexual3 e no site do Grupo SOMOS4, que patrocinou a ação desde seu início. Quando soube de minha participação no julgamento, pediu-me o mesmo. É o que passo a fazer.

Na terça-feira, dia 18/10/11, um dia normal de trabalho, consultei o site do Superior Tribunal de Justiça para uma pesquisa de jurisprudência e, para minha surpresa, a notícia principal do site informava que o Superior Tribunal de Justiça iria decidir se duas pessoas do mesmo sexo poderiam se casar na quinta-feira daquela semana, dia 20/10/115. A notícia me causou enorme surpresa, pois não tinha conhecimento que havia uma ação de um casal homoafetivo pleiteando pelo direito ao casamento civil aguardando julgamento no Superior Tribunal de Justiça. Instintivamente, tive a vontade de participar deste julgamento, realizando parte da sustentação oral – tinha absoluta certeza de que o advogado do casal, quem quer que fosse, iria fazer a sustentação oral, dada a importância do caso, donde, por ter a certeza de que eu tinha condição de colaborar a favor do casal por ser um estudioso do chamado Direito Homoafetivo há anos (com livro e artigos publicados acerca da possibilidade jurídica do casamento civil, da união estável e da adoção por casais homoafetivos à luz do ordenamento jurídico-constitucional vigente, a despeito de sua omissão acerca do tema6). Contudo, para meu desespero, a notícia do site do STJ não informava o número do recurso especial em questão, o que em tese inviabilizaria a minha pretensão de verificar o andamento do processo e descobrir o nome do advogado do casal para, ato contínuo, tentar descobrir seu telefone pela internet e contatá-lo para perguntar se eu poderia dividir o tempo de quinze minutos de sua sustentação oral, com cinco minutos que fossem.

Mas, para minha sorte, a modernidade do mundo contemporâneo nos disponibiliza a fantástica ferramenta de buscas da internet chamada google. Assim, fiz uma pesquisa com algumas palavras-chave para tentar descobrir o número do processo (algo como “casamento civil pessoas mesmo sexo rio grande sul”), sendo que, dentre os diversos resultados de busca, havia um blog que comentava a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que havia negado o direito de um casal de mulheres acessarem o casamento civil – transcrevia a ementa do mesmo, criticava o posicionamento reacionário ali esposado e, para minha enorme felicidade, informava o número do recurso especial pendente de julgamento no Superior Tribunal de Justiça, interposto pelo casal contra dita decisão do Tribunal Gaúcho – REsp n.º 1.183.348/RS7.

(mais…)

Palestra: “Novo Conceito de Família e seus Direitos”

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Igualdade na diversidade: a luta pelo reconhecimento dos direitos dos homossexuais no Brasil

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Recomendação de leitura

O artigo escrito por Osvaldo Fernandez reflete sobre a discriminação e violência contra os homossexuais, demonstra os preceitos constitucionais e os direitos fundamentais violados quando negados aos LGBT’s o direito à vida, à dignidade e à segurança. Defende a tese de que a proteção e a promoção dos direitos desse segmento específico da sociedade significa também um ganho geral para o exercício da cidadania.

“A não criminalização constitucional específica da discriminação por orientação sexual e o não reconhecimento de direitos específicos dos homossexuais – que devem, através de lutas sociais, buscar jurisprudência e analogias legais a partir de princípios gerais da Constituição Federal (“outras formas de discriminação”, por exemplo) para dar efetividade específica para o princípio abstrato da igualdade – já é uma manifestação estrutural de preconceito, que corrobora múltiplos contextos sociais de violência simbólica.”(trecho extraído do artigo)

 

Veja integra em:

http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/14332/7590

 

Artigo cientifico escrito por: Osvaldo Fernandez é Antropólogo, Professor Adjunto do Depto. de Educação e do Mestrado em Crítica Cultura da Universidade Estadual da Bahia – UNEB (Alagoinhas). Visiting Senior Research Scientist do Departament of Sociomedical Sciences, na Mailman School Public Health da Columbia University (NY/EUA), bolsista de Pós-Doutorado da Fundação CAPES – Proc. N° BEX (1960-09-1), Ministério da Educação do Brasil. Doutor em Ciências Sociais (Antropologia, 2007) pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Mestre em Ciências Sociais (Antropologia, 1993) pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Bacharel e Licenciado em Ciências Sociais (1987) pela Universidade Estadual Paulista (UNESPAraraquara). É pesquisador e professor universitário há mais de 20 anos e, desde 2003, faz parte do Núcleo de Estudos de Gênero e Sexualidade (DIADORIM) da UNEB

 

Veja integra em:

http://www.periodicos.uem.br/ojs/index.php/EspacoAcademico/article/view/14332/7590

 

Revista Espaço Acadêmico – revista multidisciplinar -ISSN 1519-6186 (on-line) – Departamento de Ciências Sociais – Universidade Estadual de Maringá (UEM) – Av. Colombo, 5790 – Campus Universitário 87020-900 – Maringá/PR – Brasil –

blog: http://espacoacademico.wordpress.com – Email: revistaespacoacademico@gmail.com

 

Veja também:

http://edmarciuscarvalho.blogspot.com/2010/07/cidadania-direitos-humanos-e.html

 

 

 

Dra. Patricia Gorisch ministrará palestra na faculdade Santa Marcelina – Confira

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Palestra:
Discriminação LGBT – sob o enfoque no Direito Internacional e decisão do Conselho de DH da ONU.

Onde:

07/11/2011

Rua Emilio Ribas, 89, Perdizes, atrás do Colegio Santa Marcelina (na
rua Cardoso de Almeida)
Faculdade Santa Marcelina.

Inscrições:

http://www.fasm.edu.br/Site-Perdizes/noticias/semana-de-relacoes-internacionais/

Advogada analisa mudanças na sociedade com possibilidade de casamento gay

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Advogada reflete sobre decisão do STJ sobre casamento gay

Hélio Filho

 

Iolanda: casamento é evolução

Casamento: Evolução x Preconceito: Retrocesso*O destino do ser humano é a evolução, ainda que esse processo seja lento e precise trilhar, para isso, caminhos doloridos e tortuosos. Embora inexista retrocesso – quando muito, um estacionamento -, um dos maiores entraves para o desenvolvimento espiritual da Humanidade, de uma forma geral, é o preconceito, ligado intimamente ao orgulho e à vaidade.

Há milênios vivendo debaixo de convenção, a maior parte da Sociedade entende e se comporta de forma a manter regras, exigindo que aqueles que não estejam enquadrados, se adaptem, ainda que compulsoriamente, como se convenções fosse a maneira certa de se viver. Quando nascemos, além de infindáveis regras e normas de conduta, até um nome já nos espera.

A palavra mais ouvida é não; e sempre que pedimos alguma coisa minimamente diferente dos ‘padrões’, diversas são as “autoridades” a ‘nos colocar de volta ao caminho certo’: além dos pais, os avós, o irmão mais velho, a madrinha, o padre, o pastor, o vizinho, o professor, o chefe, o médico, a polícia, o ‘bicho papão’,…! E ai de quem teimar; lá vem castigo.

O castigo de hoje aos ‘diferentes’ é a violência, a perseguição, o deboche, a humilhação, a marginalização, a restrição ao emprego, a restrição aos locais comuns… O castigo de hoje é a mudez, é a indignidade, é a morte! Como imaginar uma Sociedade sem diversidade, se, praticamente tudo no mundo tem dois lados, duas versões, duas vertentes (sim e não, noite e dia, dois olhos, dois ouvidos, dois braços, duas pernas, dois lados do coração, duas partes do cérebro, dois pulmões, dois rins, consciente e inconsciente…).

Absolutamente tudo muda, rápida ou lentamente, basta ‘voltarmos a fita’ da história do mundo, para verificarmos o tamanho da mudança!  Isso é evolução! Quando a Constituição de 1988 foi promulgada, reconheceu, embora muito atrasada, como entidade familiar, a união estável, vivida há mais de duas décadas, por uma infinidade de casais que, em decorrência do preconceito, permaneciam à margem da sociedade e sem usufruir diversos direitos constitucionalmente reconhecidos a quem atendia às regras convencionais, ou seja, a quem dispunha de uma certidão de casamento.

Cansada de tanto desrespeito à sua vida, vivida sempre em paralelo, sempre escondida, a Comunidade LGBT começou a bradar veementemente pelo reconhecimento de sua existência, como estudante, como profissional, como cidadão, como gente. E essa Comunidade de 10% de brasileiros, ou seja, de 19 milhões de pessoas, aflorou, pelo menos um em cada família. Essa Comunidade que direciona seu afeto para o lado oposto ao convencional, quer, exige, precisa que suas uniões sejam reconhecidas. E elas foram!

Numa decisão histórica, o Supremo Tribunal Federal, substituindo o Legislativo omisso, legal e constitucionalmente decidiu, em 5.5.2011, direitos difusos e coletivos, trazendo de volta a cidadania a 19 milhões de brasileiros, que hoje podem reconhecer suas uniões familiares, desfrutando, assim, ao menos em parte dos 78 direitos até então desrespeitados.

Na mesma esteira, o Superior Tribunal de Justiça, essa semana (out./2011), reconheceu, o casamento de duas mulheres que convivem em união estável há vários anos. O que muda? Ora, se a própria Constituição Federal determina (artigo 226, § 3º) a facilitação da conversão da união estável em casamento, em se tratando de homem e mulher, ao equiparar a união estável homoafetiva à união estável heteroafetiva, o STF já deixou aberta veia legal, agora utilizada pelo STJ.

Se a Constituição consagra o direito ao planejamento familiar, com todas as garantias daí decorrentes, preservando, assim, o direito à dignidade e à liberdade, como não estender essa liberdade ao direito de escolha do parceiro a quem se tem afeto e com quem se quer conviver (em família)?

A mudança, então, se deu em evolução, em respeito à não discriminação, em respeito à união de duas pessoas que planejam sua família, em respeito ao casamento e todos os direitos daí resultantes.

*Iolanda Aparecida Mendonça é advogada especialista em Direito Homoafetivo e membro do Grupo de Advogados da Diversidade Sexual (Gadvs).

Professora transexual mineira é a primeira a ter nome social registrado no Estado

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24/10/2011 – 16h34

Renata Tavares
Especial para o UOL Educação
Em Uberlândia (MG)

 

  • A professora transexual Sayonara Nogueira, 37A professora transexual Sayonara Nogueira, 37

A partir do próximo mês, a folha de pagamento e o registro de presença da transexual professora da rede estadual de Uberlândia (556 quilômetros de Belo Horizonte), Sayonara Nogueira, 37 anos, virão com o nome social e não mais com o de registro, Marcos Nogueira. A nomeação foi feita pelo governador Antônio Anastasia no sábado (22), por meio da criação de ações contra o preconceito a homossexuais.

Os órgãos do Estado, a partir de agora, devem chamar travestis e transexuais pelo nome social. Na prática, o nome social será adotado em documentos de identificação funcional, comunicações internas do governo do Estado e durante os atendimentos em hospitais, delegacias, escolas e qualquer outro órgão público.

Nogueira é professora de geografia em duas escolas estaduais da cidade mineira e foi a primeira transexual do Estado a ser nomeada. “Para nós essa é uma grande conquista, pois serei chamada pelo meu nome social. Isso faz com que me sinta ainda mais respeitada”, disse. Para ela, a medida mostra que os transexuais podem ocupar diversos espaços na sociedade. “Muita gente acha que travestis e transexuais estão relacionados à prostituição e nós estamos mostrando que não é bem assim”, disse.

Ela conta que trabalha com alunos que tem entre 11 e 16 anos e nunca sofreu preconceito por parte deles e dos pais, porém com colegas de trabalho sim. No ano passado, ela precisou acionar a Coordenação Especial de Políticas de Diversidade Sexual do Estado para que uma inspetora pudesse chamá-la por Sayonara. “Ela me chamava de Marcos na frente dos meus alunos e todos me conhecem por Sayonara. Me deixava constrangida. Fizemos um acordo e ela passou a me respeitar”, disse.

Além de Nogueira, Walquíria La Roche, que trabalha na secretaria de Desenvolvimento Social e é coordenadora Especial de Políticas de Diversidade Sexual também foi nomeada. A resolução é conjunta e envolve as secretarias estaduais de Planejamento, Orçamento e Gestão, além da de Desenvolvimento Social. Ela não prevê punições para quem violar o novo regulamento.

 

Fonte: UOL Notícias

A liberdade de expressão

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CENSURA & PUNIÇÃO

A liberdade de expressão

 

Reproduzido do Valor Econômico, 24/10/2011; intertítulos do OI

Não saberia discutir o caso Rafael Bastos pela mera razão de que nunca vi o humorista. Mas o debate sobre afirmações agressivas e até desrespeitosas – refiram-se a mulheres feias, refiram-se a homossexuais –, indo do deputado Bolsonaro aos humoristas, é de grande importância política. Porque está em jogo o alcance da liberdade de expressão.

Ora, o que tenho lido a respeito – e constitui um quase consenso entre os jornalistas, mas não tanto fora de seu meio – se resume assim: é inaceitável qualquer censura. É preferível que, no mais livre debate, se possa expressar o que há de mais odioso porque poderá ser contestado, do que coibir sua veiculação. Primeiro porque se alguém tiver o poder de definir o que é decente e indecente, o que é “do bem” ou “do mal”, esse alguém terá um poder ilimitado, que inevitavelmente empregará para proteger e promover o seu lado e reprimir seus opositores. Segundo porque estamos lidando com adultos. Eles não podem ter restringido seu direito de acesso a toda forma de opinião até porque só pelo acesso, pelo debate, pela exposição de ideias opostas, poderão superar o preconceito.

Creio que meu resumo é bastante fiel. Aliás, concordo com tudo isso. Só acho que esse discurso deixa de lado dois problemas sérios. O primeiro é que nenhuma liberdade é absoluta, nem mesmo a de expressão. Na Alemanha, por razões óbvias, a apologia do nazismo é proibida. Na França, negar a realidade histórica do Holocausto constitui crime. Os dois países entendem que a expressão de ideias fascistas não deve ser tolerada, pelos males que já causaram. Considera-se que os indivíduos não dispõem necessariamente de antivírus contra esses perigos.

O rigor da lei

Deixam a Alemanha e a França de ser países democráticos porque proíbem a pregação do ódio? No Brasil, a Constituição que veda a censura manda respeitar o nome, a reputação e a família. Qual o equilíbrio entre o direito de se expressar livremente e a obrigação de respeitar o outro? Esse ponto tem de ser definido. Não havendo Lei de Imprensa, ficam indefinidas as fronteiras entre o direito de se expressar e o de se proteger da calúnia. Esse limbo deixa tudo ao arbítrio do juiz.

Mas há um segundo problema – e esse me entristece. Trinta anos atrás, vivíamos sob a ditadura mais longa de nossa história. Defender a liberdade de expressão significava, então, lutar para que riquezas enormes viessem à tona. Pudera: de 1964 até 1985, passamos por três fases de suspensão até das garantias constitucionais mínimas – seis meses do Ato Institucional, em 1964, ano e meio do AI-2, entre 1965 e 1967, mais de dez anos do AI-5, começando em 1968. Na outra metade da ditadura, mesmo sem atos institucionais, as leis vigentes limitavam muito a liberdade. A esperança era, então, que a liberdade nos trouxesse ar, vida, sensibilidade, inteligência. Quando um livro, filme ou peça era proibido, víamos nisso um selo de qualidade. E quase sempre tínhamos razão.

Então por que hoje, quando se fala em liberdade de expressão, é para defender o direito a dizer e fazer o pior, não para o melhor? Repito: não me julgo capacitado a dizer o que é bom ou mau, nem quero para mim o poder legal de distingui-los. Mas, nos tempos que evoco, a liberdade era vista como criativa, produtiva de melhores relações humanas. Hoje, porém, quando ela é invocada pelos jornalistas a que aludi, é para autorizar a expressão do que há de pior no ser humano. Mais grave que Bolsonaro, aliás, foi o deputado paulista que acusou os negros de descenderem do filho maldito de Noé. Aqui, saímos dos limites democráticos e entramos no âmbito do que uma sociedade decente pode e deve castigar. Não defendo a censura. Censurar e punir são coisas bem diferentes. A censura se faz antes. Já a punição se aplica depois. A censura impede que se cometa um ato julgado errado. Curiosamente, ela torna o censurado inocente e impune porque não pôde fazer a coisa errada (supondo que fosse mesmo errada). Mais adequada é a punição, que não impede ninguém de dizer o que quiser, mas castiga com o rigor da lei, após processo justo, quem agiu criminosamente de qualquer forma, inclusive com a palavra.

A essência da liberdade

Mas hoje a liberdade de expressão deixou de ser selo de qualidade para se tornar sinal de desesperança. A maior parte dos que defenderam Rafael Bastos e outros humoristas que avançaram o sinal, pelo menos, do bom gosto, alega que qualquer limite à liberdade de expressão pode levar ao controle dos adultos por um governo que imporá cada vez mais controles e censuras. Eu concordo, contra a censura. Contudo, não é um triste sinal dos tempos que hoje, quando se elogia a liberdade de expressão, seja para tolerar o discurso vulgar, preconceituoso, que rebaixa o nível do convívio social – e não mais para criticar o que existe de errado, apresentar utopias, fazer a razão sonhar?

Nos tempos em que a América Latina padecia sob as ditaduras de direita e a Europa Oriental sob as de esquerda, dizia-se que nas gavetas havia inúmeras obras de qualidade, proibidas pela censura – e que, caindo o regime autoritário, cem flores floresceriam. Mas isso não sucedeu. Havia menos obras-primas proibidas do que se imaginava. Parece que, em geral, uma obra-prima precisa de liberdade, não só para ser publicada, mas até mesmo para ser escrita. Mas o que me entristece é ver que hoje se valoriza cada vez mais o vulgar, o reles. Anos atrás, esperávamos que a liberdade gerasse o bom e o ótimo. Agora, parece que o reles é a essência da liberdade, seu produto mais constante, talvez mais importante. Só posso dizer que lastimo esse estado de coisas.

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[Renato Janine Ribeiro é professor titular de ética e filosofia política na Universidade de São Paulo]

 

fonte: http://www.observatoriodaimprensa.com.br/news/view/_a_liberdade_de_expressao

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