Jurisprudência
Jurisprudência e comentários.
Casamento gay será legalizado na Bahia a partir de novembro
0Medida permitirá que pessoas do mesmo sexo possam se casar em todos os cartórios do estado
Fonte: Revista Brasileiros
O casamento entre pessoas do mesmo sexo passará a ser legalizado no Estado da Bahia a partir de novembro deste ano. A medida foi publicada nesta quarta-feira, dia 10 [de outubro], no Diário Oficial do Estado.
Com a decisão, todos os cartórios da Bahia poderão realizar e emitir a certidão de casamento civil de uniões homoafetivas. A medida foi assinada pela desembargadora Ivete Caldas, que atua como corregedora-geral da Justiça, e pelo desembargador Antônio Pessoa Cardoso.
União estável poliafetiva: breves considerações acerca de sua constitucionalidade
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Paulo Roberto Iotti Vecchiatti
Elaborado em 10/2012.
Fonte: Jus Navigandi
A família conjugal poliafetiva que não gere opressão a nenhum de seus integrantes deve ser reconhecida e protegida pelo Estado Brasileiro, por força do princípio da pluralidade de entidades familiares e da ausência de motivação lógico-racional que justifique a negativa de reconhecimento.
Foi noticiado em 21/08/2012 que foi lavrada uma escritura de união estável poliafetiva entre um homem e duas mulheres na cidade de Tupã/SP, na qual a Nobre Tabeliã asseverou a ausência de proibição legal e a influência dos princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa humana e da liberdade para justificar a juridicidade de tal escritura[1]. Desde então alguns escritos foram divulgados na internet comentando o fato – ressalvada a posição sempre vanguardista de Maria Berenice Dias (na notícia supra citada), em geral tem sido negada juridicidade a tal escritura, por considerada como contrária ao ordenamento jurídico pela consideração de seus defensores de que a família brasileira teria “natureza monogâmica”[2].
Um dos argumentos utilizados foi o de que, tendo os textos normativos relativos ao casamento civil e à união estável[3] utilizado a expressão “entre o homem e a mulher”, eles teriam limitado a família conjugal [juridicamente protegida] somente à união entre duas pessoas, donde não seria possível reconhecer uma união estável entre mais de duas pessoas, pela “ausência de flexão plural dos substantivos”[4]. Contudo, esse é um argumento muito fraco, pois ignora a lição de Direito Civil Clássico segundo a qual o fato de o texto normativo regulamentar um fato sem nada dispor sobre outro configurar lacuna normativa colmatável por interpretação extensiva ou analogia caso as situações sejam idênticas ou, caso diferentes, sejam idênticas no essencial, respectivamente (e não uma “proibição implícita”). Logo, o fato de o art. 226, §3º, da CF/88 ter regulamentado a união estável entre duas pessoas não significa que teria ele negado proteção à união estável entre mais de duas pessoas[5] – a qual, se caracterizada como entidade familiar, merecerá os mesmos direitos da união estável tradicional, por analogia.
Outro argumento anota que, se a bigamia é proibida (e inclusive constitui crime) e, portanto, se não é possível o reconhecimento da família conjugal matrimonializada entre mais de duas pessoas, também não o seria o da família conjugal não-matrimonializada polígama/poliafetiva. Parece-me que o argumento seria decorrente de interpretação lógica – pela lógica da proibição legal à bigamia, a poligamia e a união estável polígama/poliafetiva também estaria proibida. Embora Berenice tenha apontado na citada manifestação que a lei restringe a bigamia somente ao casamento civil e não à união estável, cabe reconhecer que este argumento, embora questionável, tem uma boa consistência legal (infraconstitucional) se nos pautarmos pela isonomia que deve existir entre casamento civil e união estável. Entendo, todavia, que essa “interpretação lógica” é superável pela consideração de que o rol de entidades familiares do art. 226 da CF/88 é meramente exemplificativo, não taxativo, de sorte ser juridicamente possível o reconhecimento de entidades familiares autônomas, além daquelas previstas nos parágrafos de dito dispositivo constitucional, o que a doutrina contemporânea isto reconhece com relativa tranquilidade, destacando-se aqui a já clássica lição de Paulo Lôbo[6], que afirma que o fato de o caput do art. 226 da CF/88 afirmar que a família merece especial proteção do Estado e não mais que a família é constituída pelo casamento e terá proteção dos Poderes Públicos (como fazia o art. 175 da CF/67-69) significa que resta protegida qualquer família, ou seja, todo agrupamento humano que se enquadre no conceito material (ontológico) de família (e não mais apenas a família matrimonializada), o que faz com que Rodrigo da Cunha Pereira[7] afirme que o caput do art. 226 consagrou o princípio da pluralidade de entidades familiares (em suas palavras, “princípio da pluralidade das formas de família”).
Nesse sentido, considerando que a família se forma pelo que denomino como amor familiar, ou seja, o amor que vise a uma comunhão plena de vida de forma pública, contínua e duradoura[8] [amor romântico/conjugal, neste caso], ou, consoante afirmado pelo Ministro Fux[9] no julgamento da ADPF 132 e da ADI 4277, que
“O que faz uma família é, sobretudo, o amor – não a mera afeição entre os indivíduos, mas o verdadeiro amor familiar, que estabelece relações de afeto, assistência e suporte recíprocos entre os integrantes do grupo. O que faz uma família é a comunhão, a existência de um projeto coletivo, permanente e duradouro de vida em comum. O que faz uma família é a identidade, a certeza de seus integrantes quanto à existência de um vínculo inquebrantável que os une e que os identifica uns perante os outros e cada um deles perante a sociedade. Presentes esses três requisitos, tem-se uma família, incidindo, com isso, a respectiva proteção constitucional”
ou ainda, na também já clássica lição de Paulo Lôbo[10], que a família se forma pela conjunção dos elementos da afetividade, da estabilidade, da publicidade e da ostensibilidade, aos quais Rodrigo da Cunha Pereira[11] acrescenta o requisito da estruturação psíquica, ou seja, a identificação recíproca de seus integrantes enquanto uma família[12] pelo fato de cada um nela ocupar um lugar, uma função enquanto elemento que liga todos os demais (família esta que, portanto, não se constitui só de afeto, mas de afeto ligado à publicidade, continuidade, durabilidade e ao intuito de constituição de família existente da união), tem-se que a união estável poliafetiva se enquadra no conceito ontológico de família e deve ser assim reconhecida.
Dessa forma, considerando que o princípio da igualdade veda diferenciações jurídicas desprovidas de fundamentação lógico-racional que as justifiquem com base nos critérios diferenciadores erigidos[13], entendo que é inconstitucional a criminalização da bigamia[14] e também inconstitucional o impedimento matrimonial ao casamento civil com pessoa casada[15] quando o outro cônjuge com isto consentir, por inexistente motivação lógico-racional que justifique a negativa de reconhecimento jurídico às famílias conjugais poliafetivas que não gerem a opressão de um cônjuge relativamente ao(s) outro(s). Faz-se essa ressalva (que não gerem opressão) porque se tem notícia ao longo da história de famílias poligâmicas nas quais o homem oprime suas mulheres – mas cabe lembrar que a opressão da mulher na família conjugal também aconteceu até bem pouco tempo nas famílias conjugais monogâmicas do mundo ocidental, só tendo acabado (normativamente) no Brasil com o advento da Constituição Federal de 1988 (até então pode-se afirmar que a mulher, de prisioneira do pai, passava a prisioneira do marido, já que sempre estava submetida à vontade despótica de um homem[16], tanto que deixava de ter capacidade civil plena para se tornar relativamente capaz com o casamento civil – monogâmico[17]), ao passo que a violência doméstica contra a mulher é um mal que ainda assola as famílias conjugais monogâmicas no mundo atual (tanto que teve que ser aprovada a Lei Maria da Penha – Lei 11.340/2006 – para se reprimir com maior rigor a violência doméstica praticada contra a mulher, cuja alta incidência justificou o reconhecimento de sua constitucionalidade pelo STF com base na igualdade material no julgamento da ADC 19).
Por outro lado, considero extremamente injusta a afirmação de que uma união estável poliafetiva seria um estelionato jurídico, que seu reconhecimento violaria a dignidade das pessoas envolvidas e ajudaria a destruir a família por supostamente se tratar de uma relação “propícia” a deixar “mazelas” em seus integrantes[18], pois uma tal afirmação: (i) implica em uma descabida naturalização da monogamia como “única” forma “aceitável/digna/válida/viável” de família conjugal; (ii) desconsidera que pelo menos para algumas pessoas a poliafetividade é capaz de trazer satisfação/realização e felicidade a seus integrantes; e (iii) ignora as diversas mazelas e opressões praticadas contra a mulher em famílias conjugais monogâmicas/monoafetivas ao longo da história (já que claramente presume que a monogamia seria o único paradigma válido/digno/aceitável/viável de relacionamento conjugal…). Não cabe ao Estado nem a quem quer que seja impedir que as pessoas adultas formem entre si famílias conjugais com quem desejem e/ou com quantas pessoas desejarem quando tal situação não implicar opressão de um ou de alguns de seus integrantes, não trouxer prejuízos a terceiros e/ou quando não haja fundamento lógico-racional que isto justifique[19] (fundamento este que há para o não-reconhecimento da família conjugal em uma situação de pedofilia, por exemplo, já que temos aqui pelo menos uma pessoa em desenvolvimento que ainda não atingiu a plena capacidade civil – cabendo lembrar, todavia, que a legislação reconhece como possível o casamento de adolescentes com mais de dezesseis anos com adultos se houver autorização dos pais – art. 1.517 do CC/02).
Fato é que ou se apresenta uma fundamentação válida ante a isonomia que justifique de maneira lógico-racional a diferenciação pretendida com base no critério diferenciador erigido ou então todos os agrupamentos humanos que se enquadrem no conceito ontológico de família supra exposto merecerão referida proteção do Estado, por mais que o moralismo dominante disto não goste (e desconheço ter sido uma tal fundamentação apresentada até o momento contra a família conjugal poliafetiva) – pois, como bem afirmado pela Suprema Corte dos EUA nos casos Romer v. Evans e Lawrence v. Texas, o mero moralismo majoritário não constitui justificação válida ante a isonomia para diferenciações jurídicas, pois, segundo o primeiro, a mera animosidade e/ou o mero desejo de prejudicar um grupo politicamente impopular não constitui um legítimo interesse governamental[20] – ou seja, não é um fundamento lógico-racional que isto justifique –, afirmando o segundo que a “Liberdade presume uma autonomia de si próprio que inclui a liberdade de pensamento, de crença, de expressão e de certas condutas íntimas”[21]. Ou, como a mesma Corte afirmou em Planned Parenthood of Southeast Pennsylvania v. Casey, “Nossa obrigação é definir a liberdade de todos, não impor o nosso código moral”, pois “No coração da liberdade está o direito de a pessoa definir seu próprio conceito de existência, de significado, de universo e do mistério da vida humana”[22], o que supõe [acrescento] a garantia de igual respeito e consideração a seu modo de ser e viver quando ele não traga prejuízos a terceiros, que inexistem no caso da união estável poliafetiva, donde ela se configura como conduta íntima que não pode ser menosprezada pelo Estado, que deve, portanto, reconhece-la em igualdade de condições com a união estável monoafetiva (monogâmica).
Em suma, a despeito de jurisprudência contrária do STJ e do STF à possibilidade jurídica de uniões estáveis paralelas (que diferem das poliafetivas, que não são “paralelas”, pois formam uma única união), a família conjugal poliafetiva que não gere opressão a nenhum de seus integrantes deve ser reconhecida e protegida pelo Estado Brasileiro, por força do princípio da pluralidade de entidades familiares oriundo da interpretação do caput do art. 226 da CF/88 e da ausência de motivação lógico-racional que justifique a negativa de reconhecimento à mesma (isonomia), o que deve ensejar, inclusive, a declaração da inconstitucionalidade do crime de bigamia e do impedimento matrimonial ao casamento civil com pessoa já casada (quando isto seja de plena concordância do outro cônjuge, claro) – argumentos estes que, ao que me consta, ainda não foram considerados pelo STJ e pelo STF.
Bibliografia
ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva, 5.ª Edição Alemã, 1.ª Edição Brasileira, São Paulo: Malheiros Editores, 2008.
ROSALINO, Cesar Augusto. União poliafetiva: ousadia ou irresponsabilidade?. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3344, 27 ago 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22501>. Acesso em: 8 out. 2012.
SILVA, Regina Beatriz Tavares da. ‘União poliafetiva’ é um estelionato jurídico. In: http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI165014,81042-Uniao+poliafetiva+e+um+estelionato+juridico (acesso em 11 ou. 2012)
LÔBO, Paulo. Famílias. 1ª Edição, São Paulo: Saraiva, 2008.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade, 3.ª Edição, 11.ª Tiragem, Maio-2003, São Paulo: Malheiros Editores.
PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios Fundamentais Norteadores do Direito de Família, 1ª Edição, Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2005.
RIOS, Roger Raupp. O Princípio da Igualdade e a Discriminação por Orientação Sexual: a Homossexualidade no Direito brasileiro e Norte-Americano, 1ª Edição, Porto Alegre: Editora Revista dos Tribunais, 2002.
VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Da Constitucionalidade e da Conveniência da Lei Maria da Penha. Clubjus, Brasília-DF: 04 mar. 2008. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.16187>. Acesso em: 08 out. 2012.
VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da Homoafetividade. Da Possibilidade Jurídica do Casamento Civil, da União Estável e da Adoção por Casais Homoafetivos, 1ª Edição, São Paulo: Editora Método, 2008.
Notas
[1] Cf. http://www.conjur.com.br/2012-ago-26/advogado-uniao-poliafetiva-nao-inconstitucional (acesso em 08.10.12).
[2] Cf. ROSALINO, Cesar Augusto. União poliafetiva: ousadia ou irresponsabilidade?. Jus Navigandi, Teresina, ano 17, n. 3344, 27 ago 2012. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/22501>. Acesso em: 8 out. 2012; SILVA, Regina Beatriz Tavares da. ‘União poliafetiva’ é um estelionato jurídico. In: http://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI165014,81042-Uniao+poliafetiva+e+um+estelionato+juridico; http://www.conjur.com.br/2012-ago-26/advogado-uniao-poliafetiva-nao-inconstitucional (matéria da Revista Consultor Jurídico nominada “Advogado diz que união estável poliafetiva não é inconstitucional” – contudo, apesar do título, a posição [atribuída ao advogado Erick Wilson Pereira] é dúbia, pois afirma que é possível o registro pelo Estado não poder intervir na família, mas afirma que “no Brasil a união afetiva tem natureza poligâmica”). Acesso em 08.10.12.
[3] Art. 226, §§3º e 5º, da CF/88, art. 1.514 e 1.723 do CC/02 e, antes deste último, art. 1º da Lei 9.278/96.
[4] Cf. ROSALINO, Op. Cit.
[5] Na ADPF 132 e na ADI 4277, o Ministro Gilmar Mendes afirmou, com precisão que “O fato de a Constituição proteger, como já destacado pelo eminente Relator, a união estável entre homem e mulher não significa uma negativa de proteção – nem poderia ser – à união civil, estável, entre pessoas do mesmo sexo” (p. 44 do voto). Afirmei praticamente o mesmo em minha sustentação oral neste julgamento, ao afirmar que dizer que é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher não é o mesmo que dizer que ela é reconhecida apenas entre o homem e a mulher, donde, como o “apenas” não está escrito, não há limite semântico no texto que impeça a exegese inclusiva da união homoafetiva no conceito constitucional de união estável por interpretação extensiva ou analogia – cf. VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. O STF e a união estável homoafetiva. Resposta aos críticos, primeiras impressões, agradecimentos e a consagração da homoafetividade no Direito das Famílias. Jus Navigandi, Teresina, ano 16, n. 2870, 11 maio 2011. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/19086>. Acesso em: 8 out. 2012.
[6] LÔBO, Paulo. Famílias. 1ª Edição, São Paulo: Saraiva, 2008, pp. 60-61.
[7] PEREIRA, Rodrigo da Cunha. Princípios Fundamentais Norteadores do Direito de Família, 1ª Edição, Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2005, pp. 165-168.
[8] VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Manual da Homoafetividade. Da Possibilidade Jurídica do Casamento Civil, da União Estável e da Adoção por Casais Homoafetivos, 1ª Edição, São Paulo: Editora Método, 2008, pp. 196-211 (“2.4.1. O Amor Familiar como o Elemento formador da Família Contemporânea”).
[9] ADPF 132 e ADI 4.277, voto do Ministro Luiz Fux, p. 13-14.
[10] LÔBO, Op. Cit., pp. 57-58.
[11] PEREIRA, Op. Cit., pp. 181-182. Em sua lição, o autor explica, com base em Lacan, que a família “não se constitui apenas de pai, mãe e filho, mas é antes uma estruturação psíquica em que cada um de seus membros ocupa um lugar, uma função, sem estarem necessariamente ligados biologicamente” (Op. Cit., pp. 165-166), donde se conclui que a estruturação psíquica familiar se caracteriza pela identificação recíproca de seus integrantes enquanto uma família.
[12] Cabe lembrar que o art. 5º, II, da Lei Maria da Penha (Lei 11.340/2006) reconhece como entidade familiar a união de pessoas que se consideram aparentadas por vontade expressa, de sorte a termos, inclusive, fundamento normativo para garantir referido conceito ontológico/material de família na atualidade.
[13] Cf., v.g., MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Conteúdo jurídico do princípio da igualdade, 3.ª Edição, 11.ª Tiragem, Maio-2003, São Paulo: Malheiros Editores, pp. 38-39, ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva, 5.ª Edição Alemã, 1.ª Edição Brasileira, São Paulo: Malheiros Editores, 2008, pp. 407-409, RIOS, Roger Raupp. O Princípio da Igualdade e a Discriminação por Orientação Sexual: a Homossexualidade no Direito brasileiro e Norte-Americano, 1ª Edição, Porto Alegre: Editora Revista dos Tribunais, 2002, pp. 53-54, e VECCHIATTI, Op. Cit., p. 118.
[14] Art. 235 do CP, bem como, por consequência lógica, todos os outros que se refiram à bigamia como crime (inconstitucionalidade parcial caso se refiram também a outras questões).
[15] Art. 1.521, inc. VI, do CC/02.
[16] Desenvolvi este argumento em VECCHIATTI, Paulo Roberto Iotti. Da Constitucionalidade e da Conveniência da Lei Maria da Penha. Clubjus, Brasília-DF: 04 mar. 2008. Disponível em: <http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.16187>. Acesso em: 08 out. 2012.
[17] Cf. Art. 6º, inc. II, do CC/1916, segundo o qual “São incapazes, relativamente a certos atos (art. 147, n. 1), ou à maneira de os exercer: […] II. As mulheres casadas, enquanto subsistir a sociedade conjugal”, situação que só se alterou com o Estatuto da Mulher Casada (Lei 4.121/1962), que acabou com essa absurda diminuição de capacidade civil da mulher durante o casamento civil (monogâmico, cabe lembrar).
[18] Cf. SILVA, Op. Cit.
[19] Tanto que se fala em princípio da mínima intervenção do Estado, no sentido de que “A intervenção do Estado deve apenas e tão-somente ter o condão de tutelar a família e dar-lhes garantias, inclusive de ampla manifestação de vontade e de que seus membros vivam em condições propícias à manutenção do núcleo afetivo”, cf. PEREIRA, Op. Cit., p. 157. Embora o autor, páginas antes, defenda a monogamia como princípio jurídico (Op. Cit., pp. 106-126), ele não apresenta uma fundamentação lógico-racional que justifique a qualificação do suposto princípio ordenador da monogamia (sic) como necessário para se manter a organização jurídica sobre a família e para o desenvolvimento da civilização – ele o defende como tal sem, contudo, demonstrar a pertinência de tal afirmação; afinal, dizer que “o desenvolvimento da civilização impõe restrições ao instinto e ao desejo” (p. 113) não explica porque especificamente o instinto/desejo poliafetivo precisaria ser restrito para a existência ou manutenção/desenvolvimento da nossa civilização; não explica porque a monogamia seria um “interdito viabilizador da organização da família” (p. 110), razão pela qual sua posição não pode ser aceita neste ponto por não apresentar fundamentação válida ante a isonomia a justificar a discriminação à família conjugal poliafetiva decorrente de sua lição.
[20] Tradução livre – neste trecho a Suprema Corte dos EUA se baseou no caso Department of Agriculture v. Moreno.
[21] Tradução livre.
[22] Tradução livre.
Justiça já converteu 370 uniões gays em casamento
0Fonte: Revista Consultor Jurídico, 26 de setembro de 2012
A Justiça brasileira já converteu 370 uniões homoafetivas em casamentos desde maio do ano passado, quando o Supremo Tribunal Federal equiparou as relações entre pessoas do mesmo sexo às uniões estáveis entre homens e mulheres. Os dados são da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT). Segundo a ONG, o estado de São Paulo lidera as conversões, com 172 casos, seguido pelo Rio de Janeiro, com 50.
Na avaliação do presidente da ABGLT, Toni Reis, o Brasil passa por um processo, e ajustes ainda são necessários. “As pessoas e os cartórios não sabem como fazer”, diz. Para a especialista em Direito homoafetivo Maria Berenice Dias, o número de conversões deve ser maior, já que não há uma contagem oficial. Além disso, cada estado tem adotado regras próprias, que facilitam a conversão ou até mesmo o casamento direto, sem a necessidade de levar o caso para a Justiça — como ocorre em Porto Alegre. “Nos estados onde isso não está regulamentado ainda é preciso ação judicial”, diz Berencie.
Foi o que ocorreu, por exemplo, com um casal de mulheres do município de Luiziânia (SP), que teve de recorrer à Justiça para conseguir converter união estável em casamento, conforme decisão do início do mês. Na sentença, o juiz de Direito Adriano Rodrigues recorreu à ao acórdão do STF do ano passado para fundamentar sua decisão, especialmente no que diz respeito ao artigo 226 da Constituição Federal, que, em seu parágrafo 3º, diz que “para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”.
Na sentença, um dos votos lembrados por Rodrigues foi a do ministro Ricardo Lewandowski.”Muito embora o texto constitucional tenha sido taxativo ao dispor que a união estável é aquela formada por pessoas de sexos diversos, tal ressalva não significa que a união homoafetiva pública, continuada e duradoura não possa ser identificada como entidade familiar apta a merecer proteção estatal, diante do rol meramente exemplificativo do artigo 226, quando mais não seja em homenagem aos valores e princípios basilares do texto constitucional”.
Outro voto mencionado pelo juiz foi o do ministro Marco Aurélio, que defendeu o direito à dignidade da pessoa humana. “A solução, de qualquer sorte, independe do legislador, porquanto decorre diretamente dos direitos fundamentais, em especial do direito à dignidade da pessoa humana, sob a diretriz do artigo 226 e parágrafos da Carta da República de 1988, no que permitiu a reformulação do conceito de família”, disse Marco Aurélio.
Segundo Rodrigues, “o Supremo apenas reconheceu uma realidade que sempre existiu”. Para o juiz, nem mesmo uma pretensa “proteção à moralidade” poderia justificar a negação do direito ao casamento aos casais homossexuais. “Será que determinadas cenas exibidas em rede nacional no Carnaval envolvendo pessoas ditas heterossexuais, para dar apenas um exemplo, não seriam muito mais ofensivas à moralidade?”, questionou.
Clique aqui para ler a decisão.
Elton Bezerra é repórter da revista Consultor Jurídico.
Escritura reconhece união afetiva a três
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21/08/2012
Foi divulgada essa semana uma Escritura Pública de União Poliafetiva que, de acordo com a tabeliã de notas e protestos da cidade de Tupã, interior de São Paulo, Cláudia do Nascimento Domingues, pode ser considerada a primeira que trata sobre uniões poliafetivas no Brasil. Ela, tabeliã responsável pelo caso, explica que os três indivíduos: duas mulheres e um homem, viviam em união estável e desejavam declarar essa situação publicamente para a garantia de seus direitos. Os três procuraram diversos tabeliães que se recusaram a lavrar a declaração de convivência pública. “Quando eles entraram em contato comigo, eu fui averiguar se existia algum impedimento legal e verifiquei que não havia. Eu não poderia me recusar a lavrar a declaração. O tabelião tem a função pública de dar garantia jurídica ao conhecimento de fato”, afirma.
Ela conta também que se sentiu bastante a vontade para tornar pública essa união envolvendo três pessoas, já que havia um desejo comum entre as partes, se tratava de pessoas capazes, sem envolvimento de nenhum menor e sem litígio. “Internamente não havia dúvida de que as três pessoas consideravam viver como entidade familiar e desejavam garantir alguns direitos. Minha dúvida é com as questões externas à relação. Não há legislação que trate sobre o assunto. A aceitação envolve a maturação do direito. Nesse caso, foi preciso atribuir o direito a partir de um fato concreto. Será que haverá algum questionamento?” reflete.
Para a vice- presidente do Instituto Brasileiro de Família, IBDFAM, Maria Berenice Dias, é preciso reconhecer os diversos tipos de relacionamentos que fazem parte da nossa sociedade atual. “Temos que respeitar a natureza privada dos relacionamentos e aprender a viver nessa sociedade plural reconhecendo os diferentes desejos”, explica.
Maria Berenice não vê problemas em se assegurar direitos e obrigações a uma relação contínua e duradoura, só por que ela envolve a união de três pessoas. “O princípio da monogamia não está na constituição, é um viés cultural. O código civil proíbe apenas casamento entre pessoas casadas, o que não é o caso. Essas pessoas trabalham, contribuem e, por isso, devem ter seus direitos garantidos. A justiça não pode chancelar a injustiça”, completa.
A escritura
“Os declarantes, diante da lacuna legal no reconhecimento desse modelo de união afetiva múltipla e simultânea, intentam estabelecer as regras para garantia de seus direitos e deveres, pretendendo vê-las reconhecidas e respeitadas social, econômica e juridicamente, em caso de questionamentos ou litígios surgidos entre si ou com terceiros, tendo por base os princípios constitucionais da liberdade, dignidade e igualdade.” A frase retirada da Escritura Pública Declaratória de União Poliafetiva resume bem o desejo das partes em tornar pública uma relação que consideram familiar e de união estável. A partir dessa premissa, a escritura trata sobre os direitos e deveres dos conviventes, sobre as relações patrimoniais bem como dispõe sobre a dissolução da união poliafetiva e sobre os efeitos jurídicos desse tipo de união.
A partir da união estável, a escritura estabelece um regime patrimonial de comunhão parcial, análogo ao regime da comunhão parcial de bens estabelecido nos artigos 1.658 a 1.666 do Código Civil Brasileiro. Nesse caso, eles decidiram que um dos conviventes exercerá a administração dos bens. Dentre os direitos e deveres dos conviventes está a assistência material e emocional eventualmente para o bem estar individual e comum; o dever da lealdade e manutenção da harmonia na convivência entre os três.
II Congresso Regional de Direito do ABCDMR terá palestras com temática de Direito da Diversidade Sexual
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O II Congresso Regional de Direito do ABCDMR terá, em sua programação, palestras relativas ao Direito da Diversidade Sexual, coordenadas pela Comissão de Defesa dos Direitos da Diversidade Sexual e pela Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, subseção de Santo André.
Abaixo destacamos a programação relativa ao tema; a programação completa do evento pode ser consultada no site da OAB. O evento é gratuito e com emissão de certificado.
29.08.2012 – 14 horas
TRANSEXUALIDADE E QUESTÕES CONTROVERTIDAS DE DIREITO DE FAMÍLIA
Expositora
DRA. TEREZA RODRIGUES VIEIRA
Advogada; Mestre em Direito das Relações Sociais pela PUC SP; Especialista em Interesses Difusos e Coletivos na ESMP SP.
***
31.08.2012 – 11 Horas
DIREITOS E GARANTIAS À CONDIÇÃO SEXUAL
Expositora
DRA. KÁTIA BOULOS
Advogada; Vice-Presidente da Comissão de Direito de Família da OAB SP.
***
Local
Fundação Santo André
Avenida Príncipe de Gales, 821 – Santo André
Inscrições / Informações
Gratuitas
Fones: (11) 4992-7933 / 4436-0312
Promoção
38ª Subseção – Santo André
Presidente: Dr. Fabio Picarelli
Coordenação do Congresso
Dra. Patrícia Bono
Presidente em exercício da OAB SP
Dr. Marcos da Costa
***Serão conferidos certificados de participação — retirar em até 90 dias***
*** Vagas limitadas ***
Justiça pune clube Paulistano por discriminação sexual
0Fonte: Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo
A secretária da Justiça e da Defesa da Cidadania, Eloisa de Sousa Arruda, aplicou a pena de advertência ao clube Athletico Paulistano, localizado nos Jardins, prevista na Lei Estadual 10.948/01, que pune administrativamente a prática de discriminação por orientação sexual.
A decisão foi publicada no Diário Oficial no dia 28 de junho, republicada na íntegra hoje (5), após a secretária entender que houve discriminação por parte do clube, que se recusou a reconhecer o parceiro de um sócio homossexual como dependente.
Em janeiro, a Secretaria da Justiça instaurou um processo administrativo para avaliar se houve ato discriminatório. Ao ser julgado em 1ª instância, pela Comissão Processante Especial da Secretaria, o clube Paulistano foi absolvido.
Após recurso, o processo foi encaminhado para 2ª Instância, em que cabe a secretária da Justiça julgá-lo. Em 25 de junho, Eloisa Arruda reformou, ou seja, modificou a decisão da Comissão Processante e advertiu o clube. Todas as partes foram comunicadas.
A partir de agora, se o Paulistano reincidir, a pena poderá ser mais rigorosa. Segundo o artigo 6º da Lei 10.948/01, estabelecimentos que cometerem discriminação, correm o risco de receberem advertências, multas, que variam conforme o poder aquisitivo, suspensão da licença estadual de funcionamento por 30 dias, e, até, cassação definitiva.
Por dentro do processo
Desde 2009, o clube Athletico Paulistano nega o pedido de um sócio homossexual que tenta incluir o parceiro como dependente. O conselho do clube defende que a inclusão é vetada pelas próprias normas estatutárias e que o rapaz pode frequentar o espaço como visitante.
A Comissão Processante Especial da Secretária da Justiça e da Defesa da Cidadania foi criada em agosto de 2002, para apurar casos como o ocorrido no clube e apurar se houve discriminação por orientação sexual, com base na Lei 10.948/01. “A Comissão tem a responsabilidade de decidir qual sanção será aplicada. É um trabalho imparcial”, explica a presidente Lucimara Nunes de Paula.
A Secretaria da Justiça recebe denúncias e elabora os processos administrativos. Cabe à Comissão, formada por cinco membros nomeados pela secretária da Justiça, instaurar o procedimento, citar as partes e reunir as provas. Em seguida, o grupo julga se houve conduta discriminatória.
Os casos julgados pela Comissão permitem recursos. São encaminhados para análise da secretária da Justiça, que julga em 2ª Instância. Depois da decisão, não cabe mais recurso, como ocorreu no processo envolvendo o Athletico Paulistano.
Fabiana Campos
Assessora de Imprensa
Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania
Governo do Estado de São Paulo
(11) 3291-2612 – Ramal: 2770
Justiça autoriza registro com dupla maternidade
0As requerentes são casadas formalmente e se submeteram ao procedimento em que coletaram os óvulos de ambas. Eles foram fertilizados por sêmen doado, sendo então formados embriões viáveis, transferidos para o útero de uma delas. Os embriões foram escolhidos pelos médicos em razão da maior viabilidade da gravidez, pouco importando de qual das duas eram provenientes.
Diante da peculiaridade do caso, o oficial de Registro Civil e das Pessoas Naturais e de Interdições e Tutelas de Jacareí consultou o juiz corregedor permanente da comarca, Fernando Henrique Pinto, sobre a lavratura do registro de nascimento da criança.
De acordo com o magistrado, havendo viabilidade jurídica da união estável e do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo, e sendo comum o uso de técnicas de reprodução assistida por casais heterossexuais, “nada impede – nem pode impedir, sob pena de violação dos princípios constitucionais – que as requerentes, civilmente casadas, tenham acesso e façam uso das mesmas técnicas científicas, para gerar desejados descendentes”. (com informações do Tribunal de Justiça de São Paulo)
Fernando Henrique também menciona que outras decisões judiciais já reconheceram a “dupla maternidade” e destaca que, se houver ineditismo no caso, seria o reconhecimento originário pelo próprio Registro Civil das Pessoas Naturais, sem a necessidade de processo de adoção. A decisão determina ainda a complementação do registro de nascimento da criança, para fazer constar como mães, tanto a mulher que a gerou quanto a mulher cônjuge da gestante.
TJ/SP sinaliza a juízes que união estável entre pessoas do mesmo sexo deve ser aceita
0Fonte: Migalhas
1/6/2012
O Conselho Superior da Magistratura do TJ/SP indicou, nesta quinta-feira que os pedidos de conversão de união estável entre pessoas do mesmo sexo devem ser aceitos por juízes de 1ª instância.
A decisão foi tomada no julgamento de um recurso apresentado pelo casal C.B. e C.R., de Bauru/SP.
Os dois vivem juntos, mas, ao tentarem a conversão de sua união em casamento, foram barrados pelo juiz. Eles recorreram e o Conselho, por unanimidade, reconheceu seu direito.
A decisão foi baseada no acórdão do STF, que, em maio de 2011, reconheceu a união estável entre pessoas do mesmo sexo. No encontro, os desembargadores limitaram suas manifestações ao efeito vinculante da decisão do STF, referindo-se também a uma decisão adotada no STJ na mesma direção.
O inteiro teor da decisão do Conselho ainda não foi divulgado.